As medidas de contenção do coronavírus têm levado companhias que atuam no segmento de transmissão de energia a relatar dificuldades de atendimento por parte de seus fornecedores e prestadores de serviço, além de problemas logísticos devido a barreiras em aeroportos e estradas e fechamento de hotéis.
A situação, se agravada, afetaria principalmente empresas com projetos em construção, que precisam cumprir com os marcos dos contratos de concessão. Por ora, no entanto, as companhias vêm mantendo seus cronogramas e não preveem atrasos em relação aos prazos exigidos pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
É o caso da EDP Brasil, que tem uma carteira de 1,4 mil quilômetros de linhas de transmissão, sendo 1,2 mil em fase de construção. A companhia afirma que alguns empreiteiros suspenderam temporariamente as atividades, mas diz não enxergar impacto disso no momento, já que costuma trabalhar com um cronograma de adiantamento de “vários meses” sobre o calendário da Aneel. A companhia tem um empreendimento em fase de licenciamento e outros quatro em obras – destes, o mais adiantado é o lote 11, no Maranhão, que entrou parcialmente em operação em janeiro.
A transmissora ISA Cteep também tem enfrentado esse tipo de problema com fornecedores contratados para as obras. Por ora, também indicou a manutenção dos prazos previstos para os projetos. “Eventual ajuste de cronograma das obras e desembolso de [capex] serão comunicados ao mercado”, disse, em nota. Nos últimos quatro anos, a Cteep arrematou treze lotes em leilões de transmissão do governo, que somam investimentos de R$ 5 bilhões – dez desses empreendimentos já estão em construção, e um deles foi energizado em agosto do ano passado, com 18 meses de antecedência em relação à data de implementação da Aneel.
A transmissora Taesa também comunicou ao mercado sobre dificuldades dos terceirizados em manter o ritmo de trabalho nos canteiros de obras. Mas, assim como outras empresas, afirmou que “nada indica” descumprimento dos prazos regulatórios de execução do projeto. A Taesa possui sete empreendimentos em construção, com um investimento de R$ 3,3 bilhões a ser executado pela empresa.
Mesmo que a situação piore para o lado das empresas e elas venham de fato a ter problemas de cronograma, os contratos de concessão admitem a ocorrência de “força maior”, como pode ser o caso da epidemia da covid-19, avalia Ana Karina, sócia de Energia do escritório Machado Meyer. A dificuldade, entretanto, seria quantificar e demonstrar que eventuais prejuízos vieram em decorrência dessa crise, afirma a advogada. Ela observa ainda que toda a cadeia do setor elétrico deve ser afetada pela situação atual e, por isso, as soluções também devem ser pensadas de forma integrada. “O ideal seria um acordo com todos os agentes, após muito diálogo”, afirmou.
As transmissoras têm ainda outra preocupação à vista: o fluxo de pagamentos para assegurar os R$ 3 bilhões necessários para realização de reforços na rede nacional este ano. “O fluxo financeiro não pode sofrer impacto. Temos R$ 3 bilhões de reforços para fazer na rede em 2020”, disse o presidente da Associação Brasileira das Empresas de Transmissão de Energia Elétrica (Abrate), Mario Miranda.
O executivo afirma que não se sabe ainda qual será o impacto da inadimplência nas distribuidoras de energia, em razão da crise e da resolução da Aneel que suspende o corte no fornecimento para consumidores residenciais inadimplentes. Parte da remuneração das transmissoras é oriunda da tarifa de energia.
Uma ideia que já foi levantada para reduzir esse risco é a de delegar os custos de transmissão de energia ao Tesouro Nacional. A proposta é da Abrace, associação dos grandes consumidores industriais de energia, que divulgou uma série de sugestões para conter efeitos da crise do coronavírus à indústria.
As preocupações das transmissoras já foram tema de uma reunião entre representantes do setor de transmissão e diretores da Aneel. “Estamos adotando providências para assegurar a prestação do serviço de transmissão com qualidade. O próprio decreto presidencial reconhece o setor elétrico como essencial. Também estamos adotando todos os cuidados com os funcionários nas operações”, afirma Miranda.
Fonte.: Valor Econômico
Por Letícia Fucuchima e Rodrigo Polito